domingo, 5 de junho de 2011

Alhambra, Gladir Cabral e Gerson Borges

Alhambra
(Gladir Cabral & Gerson Borges)

"Queria tocar os sinos
Da majestosa catedral
Pensei em compor os hinos
Pintar as faces do vitral
Mas tu me fizeste olhar o chão
E repintar os rodapés
Silenciar em meio à sombra do jardim
E foi assim que eu aprendi
A aguardar o tempo bom
A viração do vento sul
O recomeço da estação
Para plantar, para regar, para podar
Para sonhar o renascer da floração
Perto da terra, umedecer
Em meio à horta, serenar
Tua vontade obedecer
.
Um dia a tristeza disse
Que eu nunca mais seria alguém
Melhor que eu me demitisse
Pulasse deste velho trem
Mas tu me fizeste olhar o céu
E eu comecei a ver melhor
Ver teu amor a envolver a minha dor
E me fazer voar além
Da torre desta catedral
Ares de Allambra, luz e bem,
Logo depois de Portugal
Beira de rio, onda do mar, vento mais frio
Luz do luar, perto da Estrela D’alva
Pra ver a Terra amanhecer
E com o sereno repousar
Onde tua mão me colocar"



Alhambra em árabe significa a vermelha (Al Hamra). É uma cidade localizada no municipio de granada na Espanha. Como outras cidades de origem mulçumana da época, o maior atrativo da cidade é a decoração dos interiores, rica em detalhes da arte islâmica. É considerada patrimonio mundial pela Unesco:

Vista de alhambra a noite.

Vista de alhambra de dia.

Detalhes da arte islâmica em Alhambra:


Depois de postar a letra desta música do seu tumblr, o Gerson Borges nos desafiou a pensar sobre o que esta música fala. Eu não perdi a oportunidade do desafio e comecei a pensar sobre o texto e sem querer ser pretensioso ou suficientemente letrado para trazer a tona toda a riqueza literária da poesia do poeta Gladir Cabral, me dei por satisfeito em trazer a memória algumas passagens biblicas que acredito se encaixarem bem em alguns trechos desta letra.

Sem dúvida a musica fala sobre um tempo oportuno. O pensador escreveu em Eclesiastes: " Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu (Ec 3:1)."
Há tempo oportuno para se "tocar os sinos, Da majestosa catedral", tempo para se "compor os hinos" ou mesmo "Pintar as faces do vitral". O Gladir fala de um tempo de se "repintar os rodapés" e "Silenciar em meio à sombra do jardim". Tempo de reflexão e de aprendizado. Com isso aprendeu a esperar o tempo bom, a viração do tempo sul, para que se possa plantar, regar, colher.

Acho que neste aspecto, Alhambra também fala sobre a importância dos pequenos detalhes que passam desapercebidos por muitos, afinal, todos que conhecem a arte islâmica sabem da riqueza dos detalhes dos vitrais e dos tetos. Quem não se delicia com o som dos sinos e dos belos hinos de uma catedral? Por sua vez eu me pergunto: quantos ja pararam para notar o detalhe dos rodapés de uma grande catedral? De certo, não muitos. Talvez o trabalho nos rodapés seja o inicio de uma grande obra, talvez para se tocar os sinos seja preciso se preparar os rodapés, ou quem sabe o início de nossa jornada esteja nos rodapés. Antes de compor os hinos é preciso conhecer as Catedrais, é preciso saber da sua história, dos seus detalhes. É preciso esperar o tempo oportuno, mas antes que este tempo chegue é preciso que haja a preparação. Ou seria possível alguém colher sem antes arar a terra, lançar a semente, retirar as ervas daninhas e acrescentar os nutrientes necessários?

A segunda parte da música começa com uma frase interessante dentro do contexto. Fala sobre o dia em que a tristeza falou que o autor nunca mais seria alguém. Fico pensando, talvez no momento em que o poeta se debruçou sobre os rodapés, lhe veio a tristeza de se pergunta se nunca mais ele poderia compor. Será que ele nunca mais poderia tocar os sinos novamente? Quem nunca passou por uma crise de falta de inspiração? Ou mesmo de um momento oportuno para criar? Talvez o tempo de pintar o rodapé parecesse um tempo de desperdício: eu deveria estar compondo grandes melodias, não pintando rodapés. Ano passado eu tive a oportunidade de ouvir o Silvestre Kulhmmann no S8 Cultural e uma das coisas que me ficaram marcadas na minha memória foi a apresentação da canção intitulada "O Silencio é a Semente":

Eu procuro uma canção dentro de mim,
Mas nada vem. Estou mudo.
Este silêncio é cortante, pontudo;
Dele nascerá um jardim.

Desta semente silenciosa
Brotarão botões de rosa
Pousarão mil borboletas
Pretas, azuis, violetas.

Neste canteiro,
Um girassol;
Ervas de cheiro,
Um pôr de sol.

O mundo inteiro
Pára pra ouvir o rouxinol
Cantar certeiro
Em sustenido e bemol.

Antes de apresentar este belíssimo soneto composto e musicado por ele, o Silvestre nos contou sobre um tempo em que enfrentou  uma crise de inspiração. Depois deste silêncio que durou um tempo ele finalmente conseguiu compor esta musica.
Ajoelhado diante dos rodapés, esta semente silenciosa brotou no coração do poeta. Silenciar em meio à sombra do jardim nos leva a compreender o momento de tocar os sinos e compor os hinos. Às vezes, é preciso silenciar para se ouvir a voz de Deus nas coisas pequenas da vida.

Mas deveras eu e o poeta não chegaríamos a esta conclusão assim tão facilmente. E foi por isso que a tristeza se chegou e quis lhe fazer acreditar que melhor seria pedir demissão e pular do trem do que continuar pintando os rodapés. Mas mesmo nestes momentos de reflexão solitária, Deus está presente e nos acolhe em meio a nossa própria dor, nos mostra a sua grandeza e as maravilhas das Suas Mãos, nos fazendo lembrar logo além daquelas muralhas existe um Portugual, e logo além, um mar, e além do mar um horizonte, uma Estrela D'Alva e um amanhã. E este amanhã trará consigo o tempo bom que eu tanto espero, o tempo de compor, de tocar os sinos, de colher, de regar e de plantar...

Não posso deixar de registrar aqui a minha admiração por esta belíssima canção, o meu especial apreço pelo poeta Gladir Cabral e também as minhas desculpas a ele e ao Gerson pela ousadia de me prestar a lançar uma fagulha de luz sobre uma canção tão bela e tão rica. Fique aqui registrado que estes comentarios são de minha autoria e os autores não tem nem mesmo ciencia disso (espero que eles nunca tenham, quero continuar sendo amigo deles, rsrsrs). Dificil falar sobre uma canção tão bela, principalmente para alguem como eu que entende mais de fórmulas e reações químicas. E ai pessoal? Voces concordam com minhas palavras? Discordam? Deixa um comentário...

2 comentários:

  1. Sou um mero visitante na página... Acho que você não precisa pedir desculpas... seu comentário foi EXCELENTE, desde a explicação de Alhambra até as suas reflexões. Foi muito edificante para mim.
    Abraços!

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  2. Gosto muito dessa música. Engraçado que minha primeira impressão sobre ela é que se tratava de Nabucodonosor. O rei teve que silenciar em meio à sombra do jardim. Depois ocorre a reviravolta e ele olha para o céu. Obrigado pelo texto, abraço!
    Solon

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